domingo, 20 de fevereiro de 2011

Cinderela calça 54 – Stefano Benni


            Em Cinderela há alguma coisa que não me convence.
            O conto diz que a pobrezinha ficava o dia inteiro trabalhando em casa. E quando vai ao baile do príncipe logo dança a valsa, o tango e todo o resto.
            Onde ela aprendeu a dançar?
            Fez um curso por correspondência? Ou saía todos os sábados à noite para uma discoteca, ao invés de ficar em casa.
            E como a fada fazia para ter a medida do seu vestido?
            E tinha mesmo o pezinho mais pequeno que todas as mulheres do reino? E como conseguia andar?
            Eu acho que ela calçava 54, e o príncipe se apaixonou por causa disso, ele gostava de pés grandes. Os príncipes são estranhos.

            E também João e Maria não me convencem. Uma casa de chocolate. E no verão, quando fazia quarenta graus, não derretia? E o teto de marzipã? Os passarinhos não o comiam? E a privada, era feita de que?

            Se Harry Potter é tão bom como bruxo, por que não vai fazer alguma coisa de útil por aí, em vez de continuar a fazer os milhões com os filmes? Quero o filme: Harry Potter encontra água na África.

            Os dragões são os verdadeiros heróis. Estão ali fazendo a guarda à bela princesa e ao tesouro. Até que chega o herói, todo armado com uma espada mágica, e os mata. Por quê? Estavam apenas fazendo o seu trabalho. Se não fosse o dragão, o herói seria apenas um aventureiro que só conta vantagens e que sai à caça de tesouros e princesas. Em vez disso, matando o dragão, tem a desculpa de fazer uma boa figura. O dragão é um álibi. Vamos fundar o MDPD, Movimento de Defesa e Proteção de Dragões.

            Os vilões dos filmes sempre têm um plano secreto, mas não resistem e contam tudo ao herói. Fiquem um pouco calados.

            Não existem leitores crianças. Existem pessoas que começaram a ler. Se você começa a ler aos noventa anos, você é um leitor criança.

            Se sabe escrever e é também um pouco soberbo e vaidoso, pode ser escritor. Se não sabe escrever e é um pouco soberbo e vaidoso, pode ser crítico. Se sabe escrever e diz que não é soberbo e vaidoso, então é um mentiroso e pode ser político.

            Einstein era louco por sorvetes e estudava muita matemática. Um dia se perguntou: por que os sorvetes duram tão pouco e as lições de matemática duram tanto? Estudou bem a coisa e descobriu a teoria da relatividade.

            Se uma pessoa te fala que ela tem um rosto honesto, mas logo depois faz transplante de cabelo, faz lifting e se maquia para ir à televisão, então não é verdade que tem um rosto honesto, se não que necessidade teria de mudá-lo?

            Você não sabe onde está o seu gato, mas ele sempre sabe onde você está.



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